Uma pessoa culta, letrada, deve ser considerada sábia? E uma pessoa sábia, tem de ser necessariamente “estudada”, com boa formação intelectual?
Seguramente podemos responder a essas duas indagações de modo negativo, pois pare e pense: quantas pessoas sábias que você conhece que não tiveram instrução formal suficiente —quando a tiveram!—, mas são dotadas de grande sabedoria? E a hipótese contrária: quantas pessoas consideradas inteligentes, tecnicamente preparadas, com refinada formação intelectual, ocupantes de cargos importantes, mas que não têm sabedoria, você também conhece?
Inteligência e sabedoria não são termos sinônimos, quando muito se complementam. Veja o que nos diz o Livro da Sabedoria: “...supliquei, e inteligência me foi dada; invoquei, e o espírito da Sabedoria veio a mim” (Sab 7,7).
Alguns dias atrás o Ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do Supremo Tribunal Federal, em entrevista ao jornal “Valor Econômico” nos brindou com um pensamento nada usual a um juiz: até setembro de 2025, quando estará à frente desse cargo, pretende deixar, como um legado todo seu, a “total recivilização” do país. Se fosse só um “pouco de recivilização”, já teríamos um problema sério, mas não: a meta é a “total recivilização” do Brasil!
Confesso que fiquei, a um só tempo, envergonhado e perplexo. Envergonhado, porque a contenção nas opiniões pessoais em público, o distanciamento dos holofotes, o recato na vida pública e privada, mesmo sendo exigências éticas a todo e qualquer juiz neste país, foram solenemente ignoradas; e perplexo, porque o representante-mor da magistratura nacional, para espanto de muitos juízes como eu, escancarou, uma vez mais (lembremos que ele, discursando a estudantes, afirmou com dedo em riste que “Nós derrotamos o bolsonarismo!”*), outra faceta de atuação política, numa função em que tal comportamento deveria permanecer sempre à distância, para segurança e equilíbrio.
Também há pouco tempo, o Presidente Lula da Silva, repetindo o que havia dito quando fora preso em 2018, afirmou: “Eu não sou um ser humano, sou uma ideia.”
Falta de humildade e de senso moral comum, além de um olhar somente voltado aos próprios pensamentos, geram tamanha vaidade, a ponto de, inclusive, podermos considera-la “alucinógena”, pois ao nos depararmos com essas situações imediatamente ficamos assombrados com o hedonismo que alimenta esses egos inflados.
São Tomás de Aquino, em simples palavras, define sabedoria como a “visão do Alto”, isto é, a visão das realidades que nos cercam a partir do ponto mais elevado: a Vontade de Deus. E voltando aos exemplos acima citados: seria da Vontade de Deus, a um juiz, almejar “recivilizar totalmente” seus conterrâneos? Ou, a um Presidente da República, ser transcendente ao humano, uma “espetacular ideia” que deva ser admirada por toda gente?
Prudência, a “rainha das virtudes”, e sabedoria, devem andar juntas. E se assim estiverem, antes de querer recivilizar um país ou ser mais que um reles mortal, caberia ter perguntado, como num humilde exame de consciência: “é realmente isso que Deus espera de mim?”
O exercício do poder, seja ele qual for, exige muita prudência, e, quando extrapolado, voltar-se-á contra quem o exerce, até destruí-lo, pois a cada dia mais e mais pessoas se sentirão incomodadas e lhe “declararão guerra”, lutando até sua derrocada. E em mais esta vez vale relembrar a cirúrgica observação de Lord Acton, político e pensador liberal inglês do século 19: “o poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente”.
Por ora, caro leitor, de minha parte e por não conseguir enxergar um horizonte mais promissor sobre a forma como o poder vem sendo exercido por nossas altas autoridades, penso ser preciso (re)evangelizar os poderosos, ainda que lhes cause constrangimento. É preciso dizer-lhes, com o máximo respeito, quão ridículos se tornam ao fazerem tais afirmações, dada a imensurável vaidade que carregam e que desmoraliza as nobres funções que exercem. É preciso mostrar-lhes que são efêmeros, passageiros, e não infalíveis ou "deuses olímpicos, acima do bem e do mal", conforme classificou o "Estadão" os juízes do Supremo Tribunal Federal em editorial do dia 16 de outubro passado. É preciso, por fim, respeitadas todas e quaisquer crenças religiosas, dar-lhes a conhecer a célebre autoafirmação de São Paulo: “’Tudo me é permitido’, mas nem tudo convém” (1Cor 6, 12).
Do contrário, diante da indagação que intitula este artigo, e sem medo de errar, a Sabedoria irá responder: “Ando bem longe...”
Vamos, juntos, interceder pelas nossas autoridades constituídas, unidos à Virgem Maria, a “sede da Sabedoria”. Fraterno abraço!
* NOTA AOS LEITORES: asseguro-lhes que não sou “bolsonarista”, nem “lulista”, nem “fã” de qualquer outro político de plantão.