Os romanos utilizavam uma inscrição abreviada com o propósito de imprimir sua identidade e marcar presença em locais públicos, bandeiras e símbolos. Essa inscrição era “Senado e o Povo de Roma”, e sua abreviação era SPQR, do latim “Senatus Populus Que Romanus”. Na primeira metade do século I d.C, houve um relato, no mínimo inusitado, sobre o imperador Gaio Júlio César Augusto Germânico, ou Calígula, que supostamente teria nomeado um cavalo chamado Incitatus para o Senado Romano. Esse relato é frequentemente citado para ilustrar a demência e o comportamento irresponsável do imperador. É importante ressaltar que a veracidade desse relato ainda é debatida pelos historiadores.
O Senado Romano desempenhava várias funções, como aconselhamento, deliberação, controle administrativo e financeiro, além de cuidar da política externa e militar, e também detinha poder legislativo. Ao longo da história, essa instituição passou a existir em diferentes regimes políticos, desempenhando funções distintas. No Brasil, o Senado é composto por 81 senadores, sendo 3 por Estado, eleitos por voto direto. A cada quatro anos, renova-se alternadamente um terço e dois terços dos senadores. O Senado tem a função de discutir e elaborar leis federais, além de fiscalizar os atos do poder Executivo. Outra função importante do Senado é aprovar algumas nomeações feitas pelo presidente da República. Diante de tantos afazeres relevantes delegados a esses políticos, fica uma provocação: Você se lembra quais foram os senadores eleitos no último pleito?
A democracia é um regime de governo no qual o poder emana do povo e onde cada cidadão tem o mesmo direito de participar na escolha dos governantes e legisladores. Por isso, ela é ao mesmo tempo simples e complexa. A democracia é simples porque parte da escolha dos representantes feita pela população. Essa forma democrática permite a propagação e a apresentação de propostas, as quais devem ser julgadas pelos eleitores, até aqui é um caminho simples. A maior complexidade da democracia parece residir na inter-relação entre os poderes, principalmente entre o Executivo e o Legislativo, responsáveis pelo bem comum do povo. Quando há divergência entre esses poderes ou descumprimento da lei, cabe ao poder Judiciário garantir os direitos do cidadão e resolver os conflitos, baseando-se na lei e sem defender outros interesses.
Considerando a simplicidade e complexidade do sistema democrático, fica evidente a importância da participação no processo eleitoral e, posteriormente, durante o governo, acompanhando o desenvolvimento das propostas apresentadas antes da eleição. Se o poder emana do povo, é esse mesmo povo que precisa continuar a exercer o direito democrático de ser ouvido. Aqueles eleitos devem cumprir o que foi expresso nos debates ou nas propostas apresentadas durante o programa eleitoral. Falácias e mentiras não combinam com a democracia. Isso nos leva a perguntar: O que faria um cavalo no Senado Romano?
No sistema democrático, não é possível que um animal concorra a um cargo político, por motivos óbvios. Contudo, nosso sistema democrático apresenta brechas significativas, como a possibilidade de indicação de pessoas para cargos estratégicos, independentemente da qualificação ou do nível de proximidade entre indicado e indicador. Isso também independe do viés político ou ideológico e do provável risco de criar conflitos de interesses. Incitatus, Impetuoso, era o nome do cavalo que Calígula teria indicado para o Senado Romano. ’Ímpeto’ é a característica de uma pessoa que age com movimentos repentinos, por impulso e de forma precipitada. Nenhuma indicação política é precipitada ou impetuosa, sempre há um motivo ou uma estratégia por trás dela.
Como homens e mulheres de fé, como católicos, é nosso dever participar das questões mundanas, trabalhando para construir um mundo melhor, na esperança de alcançar a Pátria definitiva. A política, como local de testemunho dos leigos, demanda a preparação de pessoas convictas e com valores sólidos, pois “os filhos deste mundo são mais astutos no trato uns com os outros do que os filhos da luz” (Lucas 16,8). Como nos empenhamos e nos preparamos hoje indica o que esperamos para o futuro. Se não desejamos outro ’Impetuoso’, outra indicação política irresponsável, é necessário fortalecer a relação entre fé e política. Essa relação deve nos levar a fazer escolhas sensatas e coerentes com aquilo que acreditamos e defendemos. O presente, marcado pela distorção e pela mentira, tem muito a nos ensinar.