O peixe não percebe a água!

Em nosso último artigo, percebemos que uma mudança educacional profunda estava intimamente relacionada com o advento mais recente da Cultura da Morte. Um homem educado ainda no século XIX havia sido preparado com os conhecimentos necessários para atuar na sociedade, construí-la, compreender seus problemas e buscar soluções a partir de uma virtude cívica, fruto de seus estudos. Ele era capaz de aprender com o passado para lidar de maneira responsável com o presente, visando aprimorar a sociedade para o futuro.

Com as mudanças educacionais das quais falaremos, o homem "evolui" em seus conhecimentos de uma coisa só, tornando-se perito num assunto específico e "ignorante" em relação a todo o resto. Tal homem é facilmente manipulável, bastando que o objeto de discussão não se alinhe com sua própria área de estudos. Por não possuir conhecimento além de sua especialidade, ele aceita facilmente qualquer coisa dita por "especialistas" em outros campos!

Antes de investigarmos a fundo esta recente reviravolta educacional, no entanto, vale a pena conhecer alguns fatos históricos que prepararam a sociedade, e mais ainda o ambiente acadêmico, para sua própria decadência. Embora a educação do século XIX parecesse superior à do século XX, será necessário remontar ao surgimento das universidades, no início do segundo milênio.

Antes das primeiras universidades - Bolonha e Paris - existiam grupos de estudantes, discípulos, que se reuniam em torno de um mestre da vida espiritual, alguém de muita virtude e sabedoria, que ensinava seus discípulos a trilhar o caminho da sabedoria para encontrar a Verdade. Até então, Fé e Razão não estavam separadas, ambas contribuíam para o mesmo propósito. Quando esses grupos progrediram para as universidades organizadas, os estudos do Trivium, Quadrivium, Filosofia e Teologia foram sistematizados para esse mesmo fim.

“Mas em torno do ano 1200 dC a Universidade de Paris foi reconhecida pelas autoridades; foram-lhe concedidos inúmeros privilégios (...) aos poucos os professores passaram a gozar de uma posição conceituada na sociedade pelo cargo que ocupavam.” (ROSA, 2022, p.122)

O problema gerado pelo prestígio foi que a finalidade de ingressar nos estudos universitários começou a mudar drasticamente. Para completar essa transição, o surgimento do Diploma, as "licentiae docendi" (licenças para ensinar), permitiu que essa mudança se instaurasse de forma praticamente irreversível:

"Com isso, passou-se a atrair para a parte mais nobre da educação humana um novo tipo de aluno motivado por razões muito diferentes daquelas que impulsionavam os homens dos séculos anteriores, quando aspiravam ao conhecimento superior." (IBIDEM, p. 123)

Até então, o cristianismo havia guiado a história educacional da cultura ocidental para os cumes da sabedoria - tomemos como exemplo São Tomás de Aquino e São Boaventura -, mas podemos perceber que, em seguida, iniciou-se um declínio que, após séculos, desembocou nos vales sombrios da educação moderna.

"O peixe não percebe a água", diz o ditado. Leva um tempo, portanto, para que nós percebamos a situação da educação que recebemos. Por esse motivo, estamos revisando a história do campo educacional para compreendermos quem nos tornamos hoje.

Nas cenas dos próximos capítulos, entenderemos como esses problemas estão interligados e por que fomos levados a pensar da maneira como pensamos sobre a vida.

Camila Sordi Gil
Grupo de Estudos Pró-Vida

FONTE:
ROSA, Antônio D. Pereira. O Código da Educação: uma história verdadeira. Editora Pie Pellicane, Florianópolis, 2022.