Dando sequência na partilha dos escritos do Servo de Deus Fulton Sheen tirados do livro “Justiça & Caridade” (Editora Molokai, 2020), abordaremos a “liberdade” em artigo por ele escrito também em 1938, uma vez mais ressaltando que, apesar das décadas já passadas desde então, seu conteúdo cai como luva na realidade atual.
Seu enfoque é essencialmente na parte econômica, começando por destacar e analisar três dos princípios do liberalismo enquanto “sistema de pensamento” contraposto ao comunismo/socialismo: “O Estado não deve interferir nos negócios”, “Nada de negociações coletivas!” e “Nada de interferir no direito absoluto à propriedade!”.
“O Estado não deve interferir nos negócios”: ao contrário dos regimes comunista e fascista (no sentido originário e não na deturpação politiqueira desse termo que hoje corre solta!) que tem o Estado como “uma babá”, Fulton Sheen apresenta a visão católica, inspirada no magistério de Pio XI e de Leão XIII, para sustentar que “O Estado existe para o bem comum de todos, e não para a proteção de uns poucos interesses privilegiados”, de capitalistas ou de socialistas, laborando para distribuir as riquezas para todos e a partir dos mais pobres.
Defende, sempre transmitindo a visão católica, o direito de os trabalhadores organizarem-se a fim de aumentarem o poder de barganha e, assim, buscarem evitar a especulação e ganância de quem detém os meios de produção, pois repetindo Leão XIII, “Trabalho não é mercadoria”.
Já em relação à impossibilidade de interferência no direito absoluto à propriedade preconizado pelo liberalismo, com coragem coloca a resposta da Igreja: “Você pode acumular dinheiro ou propriedades ou capital, mas não pode fazer com eles o que quiser”, defendendo que o uso do “supérfluo está sujeito ao bem comum”. Ou seja: “uma vez satisfeita a necessidade, levando-se razoavelmente em consideração a posição de cada um, é um dever dar ao miserável parte do excedente. Do que sobrar dá tua esmola”. E entre as visões liberal e socialista, defende o “justo equilíbrio em que, por um lado, ‘permanece intacto ... o direito natural’..., que o ‘Estado não tem o direito de abolir’ e, por outro, o Estado pode ‘controlar seu uso e harmonizá-lo com os interesses do bem público’”.
Fulton Sheen, então, aprofundando a análise do conceito, ensina que “A liberdade defendida pela Igreja começa com a natureza espiritual do homem e não com a ausência de constrangimento ou com a identidade à vontade do ditador”. A liberdade humana, portanto, antecede e repugna toda e qualquer tentativa do governante de turno em querer reprimi-la ou eliminá-la. Não implica dizer que se concorde ou se defenda o direito de fazer ou pensar o que se quiser sem consequências, pois a medida, o limite para a concordância ou defesa, está na consideração do bem comum.
Muito bem a propósito desse pensamento, recentemente viralizou em vários canais da internet a incômoda e não menos assustadora frase do atual Ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino, proferida em uma tensa reunião com representantes das chamadas Big Techs. Disse-lhes o Ministro: “Esse tempo da liberdade de expressão como um valor absoluto, que é uma falcatrua, acabou no Brasil, foi sepultado”.
Se é possível e justificável argumentar que a liberdade de expressão não pode ser protegida de maneira absoluta, por outra parte e somente a partir da alternância de visões de mundo estabelecida pelo atual governo em seus poucos meses de gestão, afirmar que ela é uma “falcatrua” e que “acabou no Brasil”, traz consigo um desconforto imenso, um “quase pânico” diante do que pode vir em futuro breve, ainda mais porque tomou ares de projeto de governo por não se ouvir alguma voz do Executivo em contrário.
Já possuímos uma boa legislação para estabelecer responsabilidades administrativas, civis e penais, aos excessos no uso da liberdade de expressão, legislação essa que precisa de ajustes, mormente em tempos de fake news. Mas sem qualquer margem para erro, não será censurando ou ameaçando de censura que se avançará no plano democrático. Antes, será um perigosíssimo retrocesso, um desrespeito à dignidade da pessoa humana, um caminho quiçá sem volta para o controle ditatorial tão combatido pelo Venerável Fulton Sheen e que hoje, cada um de nós, deve levantar sua voz!
Que Nossa Senhora da Conceição Aparecida e o Anjo da Guarda do Brasil defendam nossas liberdades!
Abraços fraternos do vosso irmão em Cristo Jesus!
Rogério Sartori Astolphi
Juiz de Direito