João XXIII e a Doutrina Social da Igreja (DSI)

A 2ª Guerra Mundial e a guerra fria “não só enquadram temporalmente o pontificado de Pio XII, como constituem os seus pontos de referência obrigatórios. A preocupação central de Pio XII é a instauração de uma paz estável entre os povos: e esta será sob formas diversas, o denominador comum das suas inumeráveis intervenções aqui sem dúvida que há que situar o grande contributo de Pio XII à DSI” (p.71). Como sucessor do Papa Pio XII foi escolhido o Cardeal Ângelo José Roncalli, Patriarca de Veneza, eleito em 28 de outubro e coroado em 4 de novembro de 1958. 

O Concilio Vaticano II, inspirado por Deus, foi anunciado pelo Papa João XXIII em 25 de janeiro de 1959 na Basílica de São Paulo, em Roma. O Concílio foi convocado em 25 de dezembro de 1961 e inaugurado em 11 de outubro de 1962, com mais de 2.300 bispos. “Mais que um conjunto de textos escritos, o Vaticano II foi um acontecimento histórico: a experiência eclesial de que o Espírito de Deus conduzia a Igreja por um caminho novo e lhe inspirava uma postura diante da sociedade moderna e da sua reconciliação com ela” (p.73).

Na encíclica Mater et Magistra (1961), o Papa João XXIII compreende que existem fenômenos sociais sobre os quais projetam-se os princípios da Doutrina Social da Igreja: a socialização, que “é um fato ambivalente: pode anular a pessoa, mas pode e deve oferecer-lhe inumeráveis oportunidades para se enriquecer” (p.75) e a “crescente percepção das desigualdades a todos os níveis” (p.75). “João XXIII denuncia a discriminação do setor agrícola frente ao industrial (MM 123-149), as diferenças entre regiões dentro de um mesmo país (MM 150-156) e, sobretudo, as desigualdades entre povos ricos e pobres (MM 157-184)” (p.75). 

Na encíclica Pacem in Terris (1963) João XXIII “optou pelo regime democrático (PT 67-74). Mas o que mais o preocupa é a comunidade de nações e a paz internacional: a inutilidade da guerra para dirimir os conflitos entre nações (PT 126-129) e a insuficiência dos Estados nacionais para garantir o bem comum internacional levam-no a postular uma ordem jurídica mundial e uma autoridade que vele pelo seu cumprimento (PT 130-141). As suas reservas face à escalada na corrida ao armamento e às modernas estratégias defensivas (dissuasão) (PT 109-119) causaram um profundo impacto não só dentro, mas sobretudo fora da Igreja” (p.77).

Para o Papa João XXIII “a construção da paz é uma tarefa de todos quadrantes ideológicos” (p.77). “Ele [...] depressa se convenceu de que a Igreja, sobretudo nas suas instâncias oficiais estava muito necessitada de um impulso que a movesse a uma profunda renovação interior” (p.79). Para ele a Igreja “devia converter-se ao tema central do Concílio; a Igreja na sua dupla dimensão para dentro (como se concebe a si mesma enquanto mistério de Cristo que vive no seu corpo místico e enquanto enviada a evangelizar) e para fora (que pode dizer ela a um mundo que lhe põe questões de enorme gravidade [...])” (p.80).

A eclesiologia anterior ao Vaticano II “oscila em torno de duas categorias fundamentais: a Igreja como sociedade perfeita, desigual e hierarquicamente constituída e a Igreja com corpo místico de Cristo” (p.83). O Concilio vai utilizar a categoria de povo de Deus sublinhando “a igualdade de todos os batizados como algo de prévio e mais fundamental que a diversificação posterior de funções e serviços” (p.88). Outra categoria conciliar é a dimensão missionária “como elemento constitutivo da Igreja”, contrariando “assim o esquecimento que parecia ter caído nos anos precedentes” (p.88).

Pe. Antônio Carlos D´Elboux
Pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus
Saltinho

Referência
CAMACHO, Ildefonso. Cristãos na Vida Pública. Coimbra, Gráfica de Coimbra, sem ano.