Em sua encíclica Fratelli Tutti o Papa Francisco diz que a “fraternidade não é resultado apenas de condições nas quais se respeitam as liberdades individuais, tampouco da prática de certa equidade. Embora sejam condições que a tornam possível, não bastam para que surja, como resultado necessário, a fraternidade. Ela tem algo de positivo a oferecer à liberdade e à igualdade. O que acontece quando não há a fraternidade conscientemente cultivada, quando não há uma vontade política de fraternidade traduzida em uma educação para a fraternidade, o diálogo, a descoberta da reciprocidade e o enriquecimento mútuo como valores?” (nº 103).
O Papa aponta um inimigo da fraternidade. Para ele o “individualismo não nos torna mais livres, mais iguais, mais irmãos. A mera soma dos interesses individuais não é capaz de gerar um mundo melhor para toda a humanidade. Nem pode preservar-nos dos tantos males que se tornam cada vez mais globais. Mas o individualismo radical é o vírus mais difícil de vencer. Ilude. Faz-nos crer que tudo se reduz a deixar a rédea solta às próprias ambições, como se, acumulando ambições e seguranças individuais, pudéssemos construir o bem comum” (nº 105).
A encíclica analisa a realidade que vivemos onde alguns “nascem em famílias com boas condições econômicas, recebem boa educação, crescem bem alimentados, ou possuem por natureza notáveis capacidades. Seguramente não precisarão de um Estado ativo e apenas pedirão liberdade. Mas, obviamente, não se aplica a mesma regra a uma pessoa com deficiência, a alguém que nasceu em um lar extremamente pobre, a alguém que cresceu com uma educação de baixa qualidade e com reduzidas possibilidades para cuidar adequadamente das suas enfermidades” (nº 109).
Papa Francisco afirma que solidariedade “é uma palavra que nem sempre agrada; diria que algumas vezes a transformamos em palavrão, não se pode dizer; mas uma palavra é muito mais do que alguns gestos de generosidade esporádicos. É pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns. É também lutar contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, a terra e a casa, a negação dos direitos sociais elaborais” (nº 116). Normalmente os menos favorecidos praticam solidariedade entre si.
Fratelli Tutti ensina que as “diferenças de cor, religião, capacidade, local de nascimento, lugar de residência e muitas outras não podem antepor-se nem ser usadas para justificar privilégios de alguns em detrimento dos direitos de todos. Por conseguinte, como comunidade, temos o dever de garantir que cada pessoa viva com dignidade e disponha de adequadas oportunidades para seu desenvolvimento integral” (nº 118). É inaceitável uma pessoa ter menos direitos pelo simples fato de ser mulher e “que o local de nascimento ou de residência determine, per se, menores oportunidades de vida digna e de desenvolvimento” (nº 121).
Papa Francisco cita o Papa João Paulo II afirmando que “a justiça exige reconhecer e respeitar não só os direitos individuais, mas também os direitos sociais e os direitos dos povos (Centesimus Annus, n. 6). Têm-se muita pressão sobre os países em desenvolvimento para o pagamento da dívida externa, que muitas vezes condiciona e limita seu desenvolvimento. “Embora se mantenha o princípio de que toda dívida legitimamente contraída deve ser paga, a maneira de cumprir esse dever, que muitos países pobres têm para com países ricos, não deve levar a comprometer sua subsistência e crescimento” (nº 126).
Pe. Antônio Carlos D´Elboux – acdelboux@uol.com.br
Pároco da Paróquia Imaculado Coração de Maria
Rio Claro
REFERÊNCIA
FRANCISCO, Papa. Fratelli Tutti. Carta encíclica sobre a fraternidade e a amizade social. São Paulo: Paulus, 2020.