O Papa Francisco em sua encíclica Fratelli Tutti diz que tanto “na propaganda de alguns regimes políticos populistas como na leitura de abordagens econômico-liberais, defende-se que é preciso evitar, a todo custo, a chegada de pessoas migrantes. Simultaneamente, argumenta-se que convém limitar a ajuda aos países pobres, para que cheguem ao ‘fundo do poço’ e decidam adotar medidas de austeridade. Não se dão conta de quem por trás dessas afirmações abstratas e difíceis de sustentar, há muitas vidas dilaceradas. Muitos fogem da guerra, de perseguições, de catástrofes naturais” (nº 37).
A encíclica questiona a situação da comunicação digital, onde “quer-se mostrar tudo, e cada indivíduo torna-se objeto de olhares que esquadrinham, desnudam e divulgam, muitas vezes anonimamente. Esvai-se o respeito pelo outro e, assim, ao mesmo tempo que o apago, ignoro e mantenho afastado, posso despudoradamente invadir até o mais recôndito da sua vida” (nº 42). A respeito da internet, o Papa ensina que ela pode levar ao individualismo e ao desprezo às pessoas mais frágeis e salienta que: “A conexão digital não é suficiente para construir pontes, não é capaz de unir a humanidade” (nº 43).
O documento diz que na comunicação digital ao “mesmo tempo que defendem o próprio isolamento consumista e acomodado, as pessoas escolhem vincular-se de maneira constante e obsessiva. Isso favorece o efervecimento de formas insólitas de agressividade, com insultos, impropérios, difamação, afrontas verbais que chegam a destroçar a figura do outro, em um desregramento tal que, se existisse no constato pessoal acabaríamos todos por nos destruir mutuamente. A agressividade social encontra um espaço de ampliação incomparável nos dispositivos móveis e nos computadores” (nº 44).
O Papa admoesta que se deve “reconhecer que os fanatismos, os quais induzem a destruir os outros, são protagonizados também por pessoas religiosas, sem excluir os cristãos, que podem fazer ‘parte de rede de violência verbal através da internet e vários fóruns ou espaço de intercâmbio digital. Mesmo nos meios de comunicação católicos, é possível ultrapassar os limites tolerando-se a difamação, a calúnia e parecendo excluir qualquer ética e respeito pela fama alheia’, segundo a exortação apostólica Gaudete et Exsultate, nº 115, do próprio Papa Francisco (nº 46).
Fratelli Tutti reconhece que a “capacidade de sentar-se para escutar o outros, caraterística de um encontro humano, é um paradigma de atitude receptiva, de quem supera o narcisismo e acolhe o outros, presta-lhe atenção, dá-lhe lugar no próprio círculo. Mas ‘o mundo de hoje, na sua maioria, pé um mundo surdo (...). Às vezes a velocidade do mundo moderno, o frenesi, nos impede de escutar bem o que o outro diz. Quando está no meio do seu diálogo, já o interrompemos e queremos replicar quando ele ainda não acabou de falar. Não devemos perder a capacidade de escuta’ (n&o rdm; 48).
A acumulação esmagadora de informações que nos inundam, escreve o Papa, não significa maior sabedoria. A sabedoria não se fabrica com buscas impacientes na internet. Nem é um somatório de informações cuja veracidade não está garantida. Dessa forma, não se amadurece no encontro com a verdade. As conversas giram, em última análise, ao redor das notícias mais recentes; são meramente horizontais e cumulativas. Não se presta uma atenção prolongada e penetrante ao coração da vida, nem se reconhece o que é essencial para um sentido à existência” (nº 50).
Pe. Antônio Carlos D´Elboux – acdelboux@uol.com.br
Pároco da Paróquia Imaculado Coração de Maria
Rio Claro
REFERÊNCIA
FRANCISCO, Papa. Fratelli Tutti. Carta encíclica sobre a fraternidade e a amizade social. São Paulo: Paulus, 2020.