Na encíclica Laudato Si´, o Papa Francisco afirma que “o descanso do sétimo dia não é proposto só para o ser humano, mas ‘para que descansem o teu boi e o teu jumento’ (Ex 23,12). Assim nos damos conta de que a Bíblia não dá lugar a um antropocentrismo despótico, que se desinteressa das outras criaturas” (nº 68). O Papa continua dizendo que hoje “a Igreja não diz, de forma simplicista, que as outras criaturas estão totalmente subordinadas ao bem do ser humano, como se não tivessem um valor em si mesmas e fosse possível dispor delas à nossa vontade...” (nº 69).
Na Bíblia, consta uma legislação onde se procurou “assegurar o equilíbrio e a equidade nas relações do ser humano com os outros e com a terra onde vivia e trabalhava. Mas, ao mesmo tempo, era um reconhecimento de que a dádiva da terra com os seus frutos pertence a todo o povo. Aqueles que cultivavam e guardavam o território deviam partilhar os seus frutos, especialmente com os pobres, as viúvas, os órfãos e os estrangeiros” (nº 71). “Isto não significa igualar todos os seres vivos e tirar ao ser humano aquele seu valor peculiar que, simultaneamente, implica uma tremenda responsabilidade” (nº 90).
O Papa salienta que às “vezes, nota-se a obsessão de negar qualquer preeminência à pessoa humana, conduzindo-se uma luta em prol das outras espécies que não se vê na hora de defender igual dignidade entre os seres humanos” (nº 90). “Deixamos de notar que alguns se arrastam numa miséria degradante, sem possibilidades reais de melhoria, enquanto outros não sabem sequer que fazer ao que têm, ostentam vaidosamente uma suposta superioridade e deixam atrás de si um nível de desperdício tal que seria impossível generalizar sem destruir o planeta” (nº 90).
A encíclica, publicada em 24 de maio de 2015, diz que não “pode ser autêntico um sentimento de união íntima com os outros seres da natureza, se ao mesmo tempo não houver no coração ternura, compaixão e preocupação pelos seres humanos. É evidente a incoerência de quem luta contra o tráfico de animais em risco de extinção, mas fica completamente indiferente perante o tráfico de pessoas, desinteressa-se dos pobres ou procura destruir outro ser humano de que não gosta. Isto compromete o sentido da luta pelo meio ambiente’’ (nº 91). A terra é herança comum que deve beneficiar a todos, indistintamente.
O Papa Francisco ensina que o “meio ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos. Quem possui uma parte é apenas para a administrar em benefício de todos. Se não o fizermos, carregamos na consciência o peso de negar a existência aos outros. Por isso, os bispos da Nova Zelândia perguntavam-se que significado possa ter o mandamento ‘não matarás’, quando ‘uns vinte por cento da população mundial consomem recursos numa medida tal que roubam às nações pobres, e às gerações futuras, aquilo de que necessitam para sobreviver’ (2006)” (nº 95).
Laudato Si´ destaca que somos “herdeiros de dois séculos de ondas enormes de mudanças: a máquina a vapor, a ferrovia, o telégrafo, a eletricidade, o automóvel, o avião, as indústrias químicas, a medicina moderna, a informática e, mais recentemente, a revolução digital, a robótica, as biotecnologias e as nanotecnologias. É justo que nos alegremos com estes progressos e nos entusiasmemos à vista das amplas possibilidades que nos abrem estas novidades incessantes, porque ‘a ciência e a tecnologia são um produto estupendo da criatividade humana que Deus nos deu’ (João Paulo II em Hiroshima, em 1981)” (nº 102).
Pe. Antônio Carlos D´Elboux – acdelboux@uol.com.br
Pároco da Paróquia Imaculado Coração de Maria
Rio Claro
REFERÊNCIA
FRANCISCO, Papa. Laudato Si’. Carta encíclica sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulus/Loyola, 2015.