Nas Sagradas Escrituras, quando o apóstolo Filipe foi até Natanael e lhe anunciou ter encontrado o Messias, a postura inicial foi de descrença: “De Nazaré pode vir alguma coisa boa?” A resposta de Filipe, então, foi simples e transformadora: “Vinde e vede” (cf. João 1,45-51). Essas duas palavras resumem o movimento da fé cristã e ecoam de forma especial neste tempo em que vivemos. Não se trata de uma fé teórica ou distante, mas de um convite ao caminho e ao encontro pessoal com Cristo. É preciso caminhar para ir ao encontro daquele que se apresenta como resposta às nossas perguntas mais profundas.
O nome Natanael significa "Deus dá", e toda a nossa existência é, de fato, um dom de Deus. Porém, não um dom para uma vida vazia ou sem direção, mas para uma vida que encontre seu sentido pleno no encontro com Jesus. Como Natanael, muitos de nós caminhamos às vezes desiludidos, sem esperança, questionando se Jesus realmente consegue responder às nossas dores e angústias. Mas é necessário caminhar, pois o encontro com Cristo não se dá de maneira ilusória – é preciso buscar, desejar e ouvir essa resposta que só Ele pode oferecer.
Desde os tempos antigos, o povo de Deus sempre foi auxiliado pelos anjos em sua caminhada. A batalha descrita no Apocalipse não é fantasia, mas realidade cotidiana que cada um de nós vivencia. Todos os dias somos desafiados a dar uma resposta de fé diante dos acontecimentos, e, nesse combate espiritual, somos acompanhados pela milícia celeste. O único exército que vai em nome de Deus é o exército de São Miguel Arcanjo, capaz de vencer as forças do mal que nos cercam, nos dividem e nos confundem com tantas mentiras.
A história do Brasil também testemunha essa proteção angélica. Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, na cidade de São Miguel Arcanjo, interior de São Paulo, há um relato marcante de uma aparição do Arcanjo. Na madrugada de 29 de setembro, dia dedicado ao anjo, soldados e civis teriam presenciado um clarão no céu e a figura de um guerreiro celestial que anunciou o fim da guerra. Após o fenômeno, estabeleceu-se um armistício, cessando os confrontos exatamente no dia do Arcanjo. O capitão do exército, ao entrar na igreja, teria reconhecido na imagem de São Miguel o mesmo homem que anunciara a paz, atribuindo o fim das hostilidades à intervenção daquele que é o príncipe das milícias celestes.
Foi nesse espírito de proteção e auxílio que, no dia 26 de julho de 2025, consagramos nossa Diocese de Piracicaba a São Miguel. Com esse ato solene de consagração, com a imagem peregrina que trouxemos do Monte Gargano, na Itália, queremos colocar toda a Diocese de Piracicaba sob a proteção do Arcanjo Miguel, invocando sua intercessão sobre cada fiel, cada paróquia e sobre toda a missão evangelizadora que assumimos como Igreja.
Ao consagrarmos a Diocese, estamos afirmando nossa confiança no auxílio do céu para que sigamos a Cristo mais de perto e nos dediquemos ainda mais ao serviço da Igreja. Desejamos que, sob as asas de São Miguel Arcanjo, nosso testemunho e nosso trabalho pastoral sejam continuamente inspirados e protegidos, para que possamos superar os desafios do tempo presente, crescer em unidade e perseverar na evangelização.
Assim, o tempo de reconquista que propomos e vivemos não é conquista de espaços ou territórios, mas conquista de corações, de vidas, de famílias. É o resgate de histórias concretas de pessoas afastadas para serem apresentadas a Cristo. A reconquista não é para a glória dos anjos, mas para levar todos ao encontro com Jesus. Nesse movimento, caminhamos com o Arcanjo para encontrar Cristo. “Vinde e vede”. E, uma vez que vamos e vemos, somos também enviados em missão para continuar anunciando e chamando mais pessoas para este encontro com Jesus.
Que as palavras de Filipe, “vinde e vede”, sejam a força que move nossos corações. Que, protegidos por São Miguel Arcanjo e pelos anjos, possamos vencer o mal que nos cerca e caminhar como filhos de Deus que sabem para onde vão. No caminho e no encontro com Cristo, que possamos corresponder à vocação a que somos chamados e à promessa da Salvação, sendo testemunhas da graça que somente “Deus dá”.
Dom Devair Araújo da Fonseca
Bispo de Piracicaba